Desiludam-se todos os que acreditam que as cartas de amor são coisas do passado. Há quem alegue que o uso da internet e, em particular, do correio electrónico fez diminuir, substancialmente, o hábito de escrever cartas de amor em formato de papel e até mesmo aqueles bilhetinhos que se passam muito disfarçadamente. Não é verdade. Preste atenção a esta mensagem que anexo. É actual e foi uma menina que a dirigiu ao seu princípe encantado.
A leitura atenta do seu conteúdo permite-nos fazer uma avaliação dos princípios e dos valores que são transmitidos às crianças, pelos pais e pela sociedade em geral. E esta é uma evidência que, tal como as cartas de amor, também não nos traz nada de novo. São ensinamentos que passam de geração em geração e que, muito provavelmente, justificam o egoísmo exacerbado, a falta de respeito, a quantidade de casamentos falhados e, em consequência disso, o número actual de divórcios. Debrucemo-nos sobre o assunto.
Passo a transcrever (exactamente como foi redigida):
Passo a transcrever (exactamente como foi redigida):
"Não sei mais o que fazer porque ando doida e louca por ti Jorge Daniel! Eu mando-te esta carta porque quero saber se gostas de mim e se estás intereçado em mim.
O ideal era que estiveçes mas se não estiveres eu vou ficar muito triste e secalhar vou ter que mandar uma carta ao Tó quim mas tu é que sabes...
Todas as minhas amigas te acham o mais giro da turma e o mais adúlto. Por exemplo, quando foste meter aqueles papeis de "Bolicau" no lixo que nem se quer eram teus!!
Os meus pais têm um Mercedes e uma casa de férias na Vieira.
Responde-me que eu só penso em ti.
Filipa Alexandra"
É este o país que temos. É esta a sociedade em que vivemos. INFELIZMENTE, para todos nós. O que REALMENTE importa são os Mercedes e as casas de férias...
Todas as Cartas de Amor são Ridículas
Todas as cartas de amor são ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
como as outras, ridículas.
As cartas de amor, se há amor, têm de ser ridículas.
Mas, afinal, só as criaturas que nunca escreveram
cartas de amor é que são ridículas.
Quem me dera no tempo em que escrevia
sem dar por isso
cartas de amor ridículas.
A verdade é que, hoje, as minhas memórias dessas cartas de amor
é que são ridículas.
(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente ridículas.)
Álvaro de Campos (Fernando Pessoa)
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